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quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Flor da liberdade




Sombra dos mortos, maldição dos vivos.
Também nós... também nós... e o sol recua.
Apenas o teu rosto continua
a sorrir como dantes,
Liberdade!
Liberdade do homem sobre a terra,
ou debaixo da terra.
Liberdade!

O não inconformado que se diz
a Deus, à tirania, à eternidade.

Sepultos, insepultos,
vivos amortalhados,
passados e presentes cidadãos:

temos nas nossas mãos
O terrível poder de recusar!

E é essa flor que nunca desespera
no jardim da perpétua primavera.

Miguel Torga,
in "Orfeu Rebelde", 1958

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Para o meu filho, que é um presente que Deus me deu


És o filho, que todas as mães gostariam de ter, sinto muito orgulho em ti.


Caminhante, são os teus passos
o caminho e nada mais;
Caminhante, não há caminho,
O caminho faz-se a andar.
A andar faz-se o caminho,
e ao voltar a vista atrás
vê-se a senda que nunca
se há-de voltar a pisar.
Caminhante não há caminho
só sulcos no mar.

Antonio Machado (1875-1939)
"Proverbios y cantares XXIX" in Campos de Castilla

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Bóiam farrapos de sombra


Bóiam farrapos de sombra
em torno ao que não sei ser.
É todo um céu que se escombra
sem me o deixar entrever.

O mistério das alturas
desfaz-se em ritmos sem forma
nas desregradas negruras
com que o ar se treva torna.

Mas em tudo isto, que faz
o universo um ser desfeito,
guardei, como a minha paz,
a 'sp'rança, que a dor me traz,
apertada contra o peito.

Fernando Pessoa